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Carta ao Presidente Lula sobe Política Nacional de Mudança de Clima (11/2004)

Entregue na Reunião do FBMC - Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, do dia 30 de novembro de 2004.

30 de novembro de 2004

Ao Exmo. Sr. Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente da República
Palácio do Planalto
70068-900 Brasília-DF
Fax: 3411-2222
lula@planalto.gov.br - pr@planalto.gov.br

c.c. - Presidência da República - a/c Ministro José Dirceu
- Ministro Eduardo Campos - Ministério de Ciência e Tecnologia. DD. Presidente da CIMC
Comissão Interministerial de Mudança de Clima
- FBMC - Fórum Brasileiro de Mudança de Clima - Dr. Luiz Pinguelli Rosa
- Ministra Marina Silva - Ministério do Meio Ambiente
- Ministra Dilma Rousseff - Ministério de Minas e Energia
- Ministro Everton Vargas - Diretor do Depto. de Meio Ambiente e Temas Especiais/MRE


Senhor Presidente da Comissão,

O FBOMS - Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, com apoio de seu Grupo de Trabalho de Mudança de Clima (criado em 1992 e considerado o ramo nacional do Climate Action Network - CAN) vem à esta Comissão Interministerial de Mudança de Clima apresentar propostas que consideramos fundamentais entre as diversas medidas que o Brasil deve adotar para, por um lado, cumprir com seus compromissos internacionais, já ratificados pelo Congresso Nacional, e por outro fortalecer a liderança e protagonismo global nas negociações do regime multilateral da Convenção Quadro de Mudança de Clima e seu Protocolo de Quioto.

Entendemos também que urge a implementação das propostas adiante indicadas, uma vez que o Protocolo de Quioto entrará em vigor no início de 2005, ano em que no âmbito do regime da Convenção deve iniciada formalmente consultas e negociações para equacionar a evolução do regime após o primeiro período de compromisso do Protocolo (2008 a 2012). O Brasil é o sexto maior emissor de emissões de CO2 do planeta e portanto tem uma grande responsabilidade junto a sociedade brasileira e internacional de implementar mecanismos para a eliminação de suas emissões. Somos da opinião de que para essas negociações o Governo Brasileiro deve ter uma postura ativa e de liderança quanto ao respeito aos princípios da Convenção, e para promover um forte engajamento dos países fora do anexo 1. Internamente, contamos com uma ação governamental para preparar o país para os próximos períodos do regime, adotando políticas e programas, inclusive setoriais (por exemplo em energia renovável, transporte inter-municipal e urbano, controle de uso do solo e desmatamento, etc.) que possam ser correspondentes com as responsabilidades que nosso país tem com a prevenção, mitigação e reversão de causas e impactos associados às mudanças de clima.

Assim, gostaríamos de levar as seguintes propostas ao Governo Brasileiro, esperando que tanto a Comissão Interministerial de Mudança de Clima - CIMC quanto o Fórum Brasileiro de Mudança de Clima - FBMC, no âmbito de suas respectivas atribuições, possam sinalizar à sociedade as medidas correspondentes, preferencialmente ainda antes da realização da 10a. Conferências das Partes (CoP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que acontecerá em Buenos Aires entre os dias 06 e 17 de dezembro de 2004:

1- A adoção de uma Política Nacional sobre Mudanças do Clima, e para tanto que o Governo mobilize suas lideranças e bancada de apoio no Congresso Nacional para fazer tramitar projeto de lei, o qual também deveria ser objeto de discussão e articulação com os setores e organizações da sociedade participantes do FBMC;

Entendemos que esse a Política Nacional de Mudança de Clima deve:
a) considerar todos os princípios e compromissos assumidos pelo Brasil no regime internacional, especialmente aqueles delineados no artigo 4.1 da Convenção;
b) definir os marcos gerais que permitam o envolvimento das várias esferas de governo, e portanto, que estimulem todas as Unidades da Federação a desenvolver programas e iniciativas compatíveis com os objetivos do regime, tendo em vista o previsto na Constituição de 1988 e o princípio de responsabilidades comuns mas diferenciadas;
c) estimular a internalização dos objetivos e considerações previstas no regime internacional em políticas e programas setoriais; nas áreas de energia; habitação e cidades; transporte; agricultura e desenvolvimento agrário; conservação ambiental; resíduos; mineração etc.
d) apontar mecanismos e sistemas que possam ser utilizados para promover o cumprimento da Convenção e do Protocolo de Quioto;
e) ser flexível para poder considerar a evolução do regime internacional, e assim deixar aberta para o país oportunidades para a adoção de instrumentos e iniciativas que venham ser acordadas no âmbito das negociações;
f) que considere as propostas para o tema "mudança de clima" aprovadas na 1a. Conferência Nacional do Meio Ambiente, realizada em 2004, bem como propostas e estudos discutidos no FBMC.

2- A divulgação no país, antes da CoP-10, da Comunicação Nacional - o instrumento que cada país deve apresentar às Nações Unidas para informar o seu Inventário Nacional de fontes e sumidouros de gases de efeito estuda bem como as medidas tomadas pelo Governo para dar cumprimento ao artigo 4.1 e outros dispositivos da Convenção;



3- A definição de uma estratégia nacional para o MDL - Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, uma vez que a utilização desse instrumento certamente deverá alterar cenários futuros do país nas questões de mudança de clima (por que os projetos de MDL precisam atender tanto os critérios de adicionalidade e de desenvolvimento sustentável), para que em algum período após 2012 o Brasil possa estar melhor situado para o exercício de papéis que se espera em função das características e dinâmica das emissões e dos sumidouros de gases de efeito estufa no território nacional. Tal estratégia deve incluir também o fortalecimento dos instrumentos, inclusive de regulamentação e de participação pública, para que projetos de MDL possam de fato atender interesses públicos, além dos interesses das partes envolvidas.

4- O apoio ao CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente, para que o grupo especial sobre mudança de clima criado em 2004 possa concluir seus trabalhos voltados à inclusão de questões de mudança de clima nos procedimentos e instrumentos previstos na lei 6.938/81 - Política Nacional do Meio Ambiente, com a correspondente mobilização das organizações e entes federativos participantes do SISNAMA - Sistema Nacional do Meio Ambiente.

5- O apoio técnico e financeiro para a realização, por entidades acadêmicas, órgãos de governo ou organizações da sociedade civil, de estudos relativos à vulnerabilidade e adaptação do país às mudanças de clima, com foco nas populações e regiões mais vulneráveis;

6- O fortalecimento de programas e instrumentos públicos, nos três níveis de governo, para a conservação de florestas e diminuição do desmatamento, inclusive por meio de ampla discussão e informação para a sociedade, conforme previsto no artigo 6 da Convenção, sobre a responsabilidade do Brasil nas emissões de carbono à atmosfera.

7- A divulgação do cronograma, metas e das medidas específicas da segunda fase do PROINFA - Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia, reconhecendo a importância de tal programa para tornar a matriz energética brasileira ainda mais compatível com os objetivos da Convenção de Mudança de Clima.

8- O abandono do investimento e das medidas governamentais para a construção de usinas nucleares para geração de energia, uma vez que a opção nuclear não deve ser a resposta para o atendimento dos objetivos do regime internacional de mudança de clima, inclusivo por que seria uma diversão de recursos que podem ser usadas com mais eficiência para fontes de energia verdadeiramente sustentáveis.



9- O envolvimento e a institucionalização da participação de organizações da sociedade civil no Fórum Brasileiro de Mudança de Clima, nos trabalhos da Comissão Interministerial de Mudança de Clima, nas delegações do país junto às CoP e nas demais sessões de negociações do regime e em outras instâncias que possam vir a ser implementadas (como por exemplo um Comitê Nacional para o MDL) pelo país.

10- O estabelecimento de discussões públicas para discutir as opções e estratégias do Brasil para as atividades do país, nos períodos subseqüentes a 2012, e que sejam consistentes com o objetivo final e demais dispositivos da Convenção Quadro de Mudança de Clima.

Finalmente, contamos com uma forte atuação da delegação brasileira durante a CoP 10 para garantir que nesta reunião seja acordado um processo de preparação para as negociações para o segundo período de compromissos de redução de emissões de CO2. Também esperamos que sejam agendadas reuniões entre a delegação e membros da sociedade civil brasileira para intercâmbio de informações e discussão do andamento da reunião.

As mudanças climáticas apresentam um dos maiores desafios de nossos tempos. Acreditamos que a busca de soluções urgentes necessitará o engajamento de toda a sociedade. Para tanto o FBOMS tem o compromisso de contribuir para a formulação de políticas públicas que garantam o desenvolvimento sustentável e o futuro de nosso planeta.


Atenciosamente,


Coordenação do FBOMS
Temístocles Marcelos - Secretário-Executivo do FBOMS - temistocles@cut.org.br

Coordenação do GT Clima/FBOMS
Dr. Rubens Born / Délcio Rodrigues / Mark Lutes - Instituto Vitae Civilis -
clima@vitaecivilis.org.br

Marcelo Furtado - Greenpeace - mfurtado@dialb.greenpeace.org